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sexta-feira, 4 de fevereiro de 2022

9 lições da pandemia para o Mercado de trabalho


Com quase dois anos a viver sob o jugo da COVID-19, a maioria dos países já passou, pelo menos, por três vagas da pandemia, marcadas por diferentes variantes do vírus SARS-CoV-2.  

O acesso e aceleração do processo de vacinação têm evitado taxas de mortalidade que poderiam ser catastróficas, a avaliar pelos números registados em 2020, e a economia dos países viu-se mergulhada numa crise sem precedentes, que obrigou a reagir com intervenções fiscais, monetárias e políticas, à medida que os efeitos da crise se tornaram evidentes desde que se percebeu a dimensão deste evento inédito. Em muitos países, esses apoios ainda estavam em vigor à data do período de término do estudo comparativo do Grupo Adecco (outubro de 2021), que não contempla medidas extraordinárias assumidas pelos países na sequência da nova vaga COVID-19 provocada pela variante Ómicron. Em Portugal, já muitos dos apoios tinham cessado nessa data. 

Os países tiveram de lidar com o vírus, mas cada um fê-lo à sua própria maneira. Então, o que é podemos aprender? Haverá uma receita política mais bem-sucedida do que outras? O Grupo Adecco comparou as respostas governamentais à crise COVID-19, em 20 países, entre janeiro e outubro de 2021 e tirou nove ilações que os governos devem considerar nas suas opções.  

1. OS PAÍSES QUE MAIS INVESTIRAM TIVERAM MAIS SUCESSO 

De forma geral, os governos que mais investiram no apoio aos mercados de trabalho obtiveram os melhores resultados em termos de minimização do desemprego e de regresso mais rápido ao crescimento. Singapura, EUA, Austrália, Nova Zelândia e Canadá investiram mais no apoio "above the line" - despesas públicas ou reduções de impostos - e beneficiaram das mais fortes recuperações económicas.   

2. SALVAR VIDAS SALVA A ECONOMIA 

Na altura da análise do Grupo Adecco - que terminou pouco antes do aparecimento da variante Ómicron - três países destacaram-se por terem lidado bem com a pandemia, tanto quanto aos impactos sanitários, como económicos: Coreia do Sul, Austrália e Nova Zelândia. Nos três casos, o forte desempenho económico está enraizado no seu sucesso em minimizar a infeção. 

A Coreia do Sul, em particular, mostra que quando a situação sanitária é bem controlada, o apoio económico pode ser orientado de forma eficiente: teve um bom desempenho apesar de ter gasto apenas 6,4% do PIB - um quarto do montante gasto em alguns outros países, tais como os EUA.  

3. CONTROLO DE FRONTEIRAS FOI A PRINCIPAL MEDIDA DE BLOQUEIO 

Contrariamente ao que se esperava, a análise não encontrou uma ligação clara entre o rigor das medidas de confinamento e o impacto do vírus, com uma exceção: o controlo de fronteiras. Contudo, acreditamos que este dado pode ter apenas uma utilização limitada para o futuro, por duas razões. 

Primeiro, é mais difícil para os países com fronteiras terrestres controlar a circulação de pessoas: em segundo lugar, há provas esmagadoras de antes da pandemia de que a mobilidade transfronteiriça de talentos impulsiona as economias, pelo que o controlo de fronteiras pode tornar-se rapidamente contraproducente. Muitos países já estão a assistir a escassez de mão-de-obra associada a restrições à circulação relacionadas com a pandemia. 

4. DIVERSAS POLÍTICAS DE APOIO ÀS EMPRESAS E AOS TRABALHADORES FORAM EFICAZES 

Nos países analisados, as medidas de apoio às empresas incluíram crédito, subsídios, isenções ou adiamentos fiscais, apoio às licenças por doença e regimes de compensação de trabalho a curto prazo - através dos quais o governo pagaria parte ou a totalidade do salário de um funcionário, em troca da manutenção do trabalhador empregado pela empresa. As medidas de apoio aos indivíduos incluíam o acesso ao subsídio de doença, subsídios de desemprego, e apoio financeiro direto. 

Quando analisadas quais as medidas específicas particularmente eficientes, as provas apontavam para regimes de compensação de trabalho a curto prazo. Mas não há uma única resposta correta: os EUA concentraram-se mais no apoio às empresas, enquanto a Austrália se concentrou mais nos indivíduos e ambas as economias tiveram boa reação. 

5. TRABALHADORES INDEPENDENTES PRECISAM DE APOIO 

O Grupo Adecco tem vindo a chamar a atenção para a quantidade de programas de apoio aos trabalhadores que não conseguem cobrir o número crescente de pessoas que trabalham por conta própria (trabalhadores independentes e profissionais liberais), que trabalham em regime freelance ou que não têm uma relação empregador-empregado tradicional. 

O estudo mostrou que, em muitos países, a pandemia obrigou os governos a olhar para este problema, pela primeira vez, seriamente. O Grupo Adecco espera que importante indicador do mercado conduza a uma concentração a longo prazo nesta classe crescente de profissionais.  

6. OS APOIOS DEVEM SER CÉLERES E SUSTENTADOS 

O Reino Unido está no lugar mais baixo do ranking de 20 países deste tópico, apesar de investir uma das mais elevadas percentagens do PIB em apoios: 19,3%. O Grupo Adecco aponta duas razões: primeiro, o frequente hiato de vários meses entre os anúncios dos apoios e a sua entrada na economia real; segundo, o apoio foi em grande parte retirado mais cedo em 2021 do que em outros países da nossa amostra. Uma situação que é espelhada em Portugal. Uma eliminação súbita ou antecipada das medidas de apoio pode pôr em risco a recuperação económica. 

7. VACINAÇÃO versus RECUPERAÇÃO 

Existe uma forte correlação entre a rapidez do processo de vacinação das populações e a recuperação económica. Os dois extremos do espectro são ilustrados por Singapura - onde a rápida implementação da vacina levou a um forte ressurgimento económico - e pela Áustria, onde a hesitação face ao processo de vacinação atrasou a recuperação. Portugal, com uma taxa de vacinação próxima dos 90% registou crescimento, mas com imensas assimetrias. 

8. TODAS AS REGRAS TÊM EXCEÇÕES 

Nada é simples e as lições que a pandemia nos trouxe têm várias camadas. A Suécia é o terceiro país com melhor desempenho económico, apesar de uma baixa classificação no ranking dos países em matérias de resultados de saúde (16º lugar). Os EUA também tiveram um bom desempenho económico apesar dos maus resultados em termos de saúde. A economia do México manteve-se resistente apesar do apoio negligente do governo. A situação da Covid pode mudar rapidamente, como se constatou com o aparecimento da Ómicron. Mas a lição geral para futuras crises pandémicas é clara: a melhor forma de minimizar os danos económicos é controlar os impactos na saúde, ao mesmo tempo que se apoia eficazmente os trabalhadores durante períodos de restrições sanitárias para que possam voltar a ser produtivos assim que as circunstâncias o permitam. 

9. É URGENTE REVER E PREPARAR QUADROS DE REGULAMENTAÇÃO AJUSTADOS AO PERÍODO PÓS-COVID-19 

A pandemia colocou um enfoque adicional em alguns aspetos que não tinham tanta relevância como agora, nomeadamente na necessidade de: investir no bem-estar dos profissionais e no equilíbrio entre vida profissional e familiar; estabelecer um conjunto claro de direitos e responsabilidades no contexto do trabalho remoto, no contexto de um novo paradigma de trabalho marcado pela flexibilidade. A este fenómeno, alia-se uma a agilidade do mercado de trabalho, que exige aos governos repensarem a regulamentação de diversas formas de trabalho, tal como os trabalhos temporários e independentes. É urgente a implementação das reformas necessárias do mercado de trabalho para que as economias possam entrar numa retoma sustentada e com sucesso.