quarta-feira, 18 de janeiro de 2023

"O Jardim das Cerejeiras" no Teatro dos Aloés



O Teatro dos Aloés repõe a encenação de José Peixoto de "O Jardim das Cerejeiras", obra-prima de Anton Tchekhov assinalando os 119 anos da sua estreia. "O Jardim das Cerejeiras" ou "Cerejal" como é mais conhecida a última peça escrita por Anton Tchekhov, foi representada pela primeira vez a 17 de janeiro de 1904 pelo mítico Teatro d'Arte de Moscovo numa encenação de Constantin Stanislavski. Foi representada como uma tragédia naturalista, no entanto, a peça, segundo Tchekhov, foi pensada como comédia. A encenação de José Peixoto assenta fortemente na comicidade da tragédia humana e nessa duplicidade que marcava a eterna discussão Stanislavski-Tchekhov. A fábula é simples: uma família de aristocratas falidos perde a sua propriedade num leilão, quem a compra é o neto de um antigo servo da família.

Como em todas as obras de Tchekhov, "O Jardim das Cerejeiras" está longe de ser uma peça que se esgota na representação desta fábula e continua a colocar questões, quer em relação à sua estética, quer ao seu sentido mais profundo. O eterno ridículo - agente de comicidade e de tragicidade - de uma aristocracia em plena decadência, ignorante e impreparada para lidar com a ascensão de uma burguesia que pretende transformar a sua casa de família numa estância de férias rentável, é um dos desafios da peça no que respeita ao tempo presente: a forma como assistimos serenos às alterações produzidas nas nossas cidades e centros históricos que gradualmente se transformam em hipermercados descaracterizados para consumo turístico. 

A dramaturgia assenta fundamentalmente na descoberta das várias camadas com que Tchekhov constrói as suas personagens, revelando os seus "estado de alma", as suas constantes contradições, os seus comportamentos e emoções. O espectáculo, faz uso dos corpos dos actores como matéria de expressão em conflito com o próprio texto, pondo em evidência as verdadeiras tensões por detrás das cenas propostas pelo dramaturgo - o ridículo das ações e inquietações humanas. O cenário fantasmagórico de José Manuel Castanheira cria um jogo de luz-sombra, sublinhando o que as personagens têm de instável e permanente. 

Recreios da Amadora
De 18 a 22 de janeiro (quarta a sábado às 21h00 | domingo às 16h00).