Em 2020, um dos focos da programação da Culturgest é a Ecologia, desde conferências, à dança até às artes visuais. O Mês de Janeiro abre com o projecto Anthropocene Campus Lisboa: Parallax e as conferências de Scott Knowles e Dipesh Chakrabarty que se insere no Lisboa Capital Verde Europeia 2020; ainda em Janeiro, há Tempestade Mental, uma assembleia de jovens sem a presença de adultos que irá falar sobre Terra: que Futuro?; em Março, regressa, Vera Mantero com O Limpo e o Sujo; em Maio, a primeira exposição antológica de Gabriela Albergaria, cujo percurso tem sido pautado por uma detalhada investigação sobre a nossa relação com a natureza.
Ainda, no primeiro semestre do ano, serão apresentados espectáculos de dança imperdíveis: em Janeiro, a estreia de Onironauta, de Tânia Carvalho; em Fevereiro, 10 000 Gestos, do coreógrafo francês Boris Charmatz; em maio, A Love Supreme, com coreografia de Salva Sanchis + Anne Teresa De Keersmaeker a partir da música de John Coltrane chega em Março; e a estreia nacional do novo espectáculo Mal - Embriaguez Divina, de Marlene Monteiro Freitas, no mês de Junho.
Conferências e Debates
Assim, em Janeiro, a programação tem início com as conferências Anthropocene Campus Lisboa: Parallax, nos dias 7 e 9 de Janeiro, com entrada gratuita. O (embora contestado) termo académico “Antropocénico” representa as alterações de origem humana que actualmente afectam de forma inaudita a Terra e os seus ecossistemas e desafia-nos a entender, percorrer e moldar, de forma consciente, um futuro onde as forças da tecnologia, cultura, indústria e sociedade ajam de acordo com os limites e recursos do nosso planeta. O programa, organizado em parceria com o CIUHCT — Centro Interuniversitário de História das Ciências e da Tecnologia inclui duas conferências e uma exposição da artista nova-iorquina Aidan Koch, que nos desafiam a entender, percorrer e moldar, de forma consciente, um futuro onde as forças da tecnologia, cultura, indústria e sociedade ajam de acordo com os limites e recursos do nosso planeta.
No dia 7 de Janeiro, às 18:30, Scott Knowles fala sobre A Governanção do Risco num Planeta em Aquecimento. Professor e historiador de tecnologias e políticas públicas das cidades modernas, com particular interesse no risco e nas catástrofes, Scott Knowles é research fellow no Centro de Pesquisa de Desastres na Universidade de Delaware e aborda os riscos, a gestão, a vulnerabilidade e a resiliência dos desastres lentos e reflete sobre como o Antropoceno — com as suas topologias socioculturais, espaciais, temporais e ambientais específicas — pode ajudar a entender e conceber novas ferramentas para lidar com esta questão.
No dia 9 de Janeiro, às 18:30, o historiador Dipesh Chakrabarty falar sobre O Clima da História, 10 anos depois de ter publicado The Climate of History: Four Theses, texto criticado por apoiar uma universalidade que ignora classes, raças e géneros no desenvolvimento da pegada ecológica da Humanidade, em contraste com as teses de Chakrabarty no campo da teoria pós-colonial. Provocou uma discussão acesa sobre a relevância das divisões políticas e socioeconómicas entre os hemisférios norte e sul nas ameaças que põem em causa a sobrevivência. Recentemente, Chakrabarty defende uma alteração das formas de ser e conhecer humanas, para as humanidades poderem “ultrapassar um antropocentrismo profundamente enraizado e venerado e aprender a olhar para o mundo humano através de pontos de vista não-humanos”.
Teatro
Nas artes performativas, de 15 a 18 de Janeiro, a peça de teatro Virgens Suicidas marca o regresso de John Romão à encenação e inspira-se na novela Mine-Haha, or On the Bodily Education of Young Girls, de Frank Wedekind. Com textos de Mickael de Oliveira e música de Caterina Barbieri, o espectáculo é interpretado por Luísa Cruz, Vera Mantero, Mariana Tengner Barros e um grupo de jovens ginastas. As personagens habitam um espaço confinado ao feminino, onde se observa uma vida rotineira e rígida: dedicam-se à educação física, ao teatro, à dança, à anatomia, num ambiente pautado pela disciplina e pela competitividade. Há algo de inquietante entre as paredes deste lugar: para além das raparigas sofrerem de isolamento absoluto, afastadas do resto do mundo, a sua submissão a uma disciplina física severa desperta em cada uma delas um estado de excepção a desejos violentos de aniquilação.
Depois da Culturgest, Virgens Suicidas é apresentado, no Campo Alegre - Teatro Municipal do Porto, nos dias 24 e 25 de Janeiro.
Dança
Na dança, destaque para a estreia de Onironauta, de Tânia Carvalho, 10 000 Gestos, do coreógrafo francês Boris Charmatz, A Love Supreme com coreografia de Salva Sanchis e Anne Teresa De Keersmaeker a partir da música de John Coltrane e o novo espectáculo, Mal - Embriaguez Divina, de Marlene Monteiro Freitas.
Onironauta, de Tânia Carvalho, está em palco nos dias 30 e 31 de Janeiro e 1 e 2 de Fevereiro. Tânia Carvalho constrói a sua cosmogonia misteriosa num conjunto de códigos que transcendem a própria dança e as suas criações vagueiam pelas sombras, pela vivificação da pintura, pelo expressionismo e pela memória do cinema. Onironauta (do grego óneiros, sonho + náutés, navegante) remete para o mundo dos sonhos e do invisível. Viajar através dos sonhos pode ser uma forma de criar uma obra de arte, mas também de a entender.
A 21 e 22 de Fevereiro, Boris Charmatz, um dos coreógrafos mais influentes da actualidade, volta à Culturgest para apresentar 10 000 Gestos, uma chuva contínua de dez mil movimentos únicos onde cada um é executado apenas uma vez para depois desaparecer para sempre. Ao contrário do espectável, a explosão de movimentos não origina um sentimento de aceleração mecânica, mas aproxima-se da imobilidade. A experiência de ver 10 000 gestos que nunca são completados ou repetidos tem um efeito hipnótico e convida à meditação. Um tributo impressionante à dança, a mais efémera de todas as formas de arte.
Em maio, nos dias 22 e 23, A Love Supreme, com coreografia de Anne Teresa De Keersmaeker e Salva Sanchis, a partir da música de John Coltrane. Tal como no álbum lendário, a composição e a improvisação entrelaçam-se de forma indiscernível, numa interpretação que reflecte a vitalidade imortal da música de John Coltrane, numa liberdade ilimitada de improvisação, onde cada um dos quatro bailarinos “incorpora” um dos instrumentos do quarteto de Coltrane.
Finalmente, de 18 a 20 de Junho, Marlene Monteiro Freitas que, em 2018, foi galardoada com o Leão de Prata da Bienal de Veneza, estreia Mal – Embriaguez Divina, um espectáculo de dança onde o Mal se divide em juízes e jurados, mais parecidos com um coro sob o efeito de um feitiço. Contudo, quando vistos à distância, as suas almas estão em êxtase, confinadas a um espaço pequeno demais.
Artes Visuais
Álvaro Lapa será alvo de uma exposição que pode ser visitada de 25 de Janeiro a 19 de Abril (inauguração na noite de 24 de Janeiro), com curadoria de Óscar Faria. Lendo Resolve-se: Álvaro Lapa e a Literatura parte da série de pinturas Os Cadernos de Escritores que o pintor e escritor português realizou entre 1975 e 2005 (um ano antes da sua morte) e sublinha os constantes reenvios que o artista promovia entre pintura e literatura, numa tentativa de descodificar a sua obra enigmática, marcada pela constante ideia de atrito. Trata-se também de salientar a idiossincrasia de um dos projectos mais relevantes da arte portuguesa do século XX através das homenagens a autores maiores — Homero, Pessoa, Kafka, William Burroughs ou Beckett — realizada por Lapa ao longo de 30 anos.
De 4 de Abril a 19 de Julho, o som será tema da colectiva A Exposição Invisível, com curadoria de Delfim Sardo (inauguração: 3 de Abril, às 22:00). Apresenta obras sonoras que, desde as primeiras vanguardas do século XX até hoje, expandem a relação entre o som e o espaço, desde os trabalhos pioneiros de Kurt Schwitters e Luigi Russolo, passando por obras históricas de On Kawara ou Bruce Nauman até trabalhos recentes de Ricardo Jacinto ou Janet Cardiff. Esta exposição é uma versão ampliada da exposição originalmente concebida por Delfim Sardo e apresentada no Marco, em Vigo, no Centro José Guerrero de Granada e no CCA de Tel Aviv.
Em maio - de 16 de maio a 6 de Setembro (inauguração a 15 de maio), é apresentada a primeira exposição antológica de Gabriela Albergaria, artista portuguesa que vive e trabalha em Londres. O seu percurso no campo do desenho e da escultura é permanentemente pautado por uma cuidadosa investigação sobre a nossa relação com a natureza. Nas suas esculturas, nos seus desenhos ou no trabalho que inclui a fotografia, a representação da natureza é sempre orientada por um olhar que revela os processos históricos e perceptivos da aculturação do natural e da sua apropriação.
No Porto, a Culturgest recebe uma exposição que faz parte do projecto Reacção em Cadeia, desenvolvido em parceria com a Fidelidade Arte (Chiado), com curadoria de Delfim Sardo: de 25 de Janeiro a 24 de maio (inauguração: 24 de Janeiro), Sol Cego/Blind Sun, de Elisa Strinna, artista italiana que tem desenvolvido um trabalho sistemático sobre as relações entre os fluxos de comunicação e as tecnologias que permitem a sua condução e distribuição e o humano. As suas obras — escultura, vídeo, som e performance — partem da ideia física de condutores e cablagens, apresentadas como se pertencessem a um tempo perdido, uma referência à decadência inevitável do novo.