segunda-feira, 25 de maio de 2015

«Número Zero», o novo romance de Umberto Eco, já à venda


A Gradiva acaba de publicar, Número Zero, de Umberto Eco, um romance de um autor exímio a contar histórias, onde não falta a reflexão e a ironia.

Número Zero é um romance que não deixa ninguém indiferente à reflexão sobre os jornais e a missão do jornalismo. A pretexto da criação de um novo jornal diário, a notícia está no centro das atenções (ou uma certa ideia de notícia), assim como os leitores (ou a percepção que se pretende ter deles), a par das regras e intenções em que assenta esta publicação (ou a «fachada» que ilude a realidade). Interesses que pouco ou nada têm a ver com a produção de boa informação ditam o que a redacção deverá desenvolver. Poderá um órgão de comunicação social servir para ter os inimigos na mão e chegar aonde se quer?

Um jornal que está a dar os primeiros passos muito tem para decidir. E esta obra de Umberto Eco torna-se, nesta vertente, uma espécie de «manual» de decisões onde a qualidade do produto final está longe das preocupações de topo. Sendo esta uma obra de ficção, a leitura que pode ser feita do que lá se escreve vai além da boa leitura que a narrativa proporciona. Esta tem todos os ingredientes de uma trama que atrai – amor, poder, conspiração, morte – reunidos com a mestria de um autor que é um excelente contador de histórias.

Na redacção não falta um redactor paranóico que segue atrás de pistas que remontam ao fim da Segunda Guerra Mundial. Investiga, soma factos e conclui. Mas as suas conclusões têm um resultado inesperado. Para si. Para o jornal. Para os próprios colegas. O jornalista convencera-se de que fizera uma descoberta que era «dinamite» a respeito de Mussolini. Contudo, esse é apenas um ponto num enredo que segue pelos meandros da política, envolvendo o Vaticano, a máfia, os juízes e os serviços secretos.

Aqui se apresenta um pequeno excerto da obra:

O que faço agora? Se ponho o nariz de fora, arrisco. Convém-me esperar aqui, na pior das hipóteses estão lá fora à espera que eu saia. E eu não saio. Na cozinha há vários pacotes de biscoitos e carne enlatada. De ontem à noite ficou-me também meia garrafa de uísque. Pode servir para deixar passar um dia ou dois. Deito duas gotas (e depois, talvez, mais duas gotas, mas só da parte da tarde, porque beber de manhã estupidifica) e tento voltar ao início desta aventura, sem precisar sequer de consultar a disquete, porque me lembro de tudo, pelo menos por agora, com lucidez.

O medo de morrer dá fôlego às memórias.
Para este jornal diário chamado Amanhã, o passado ensombra o presente e transforma o futuro.


Sobre o autor

Umberto Eco nasceu em Alessandria, em 1932. Filósofo, medievalista e semiólogo, estreou-se na narrativa com O Nome da Rosa (Prémio Strega 1981), a que se seguiram O Pêndulo de Foucault, A IIha do Dia Antes, Baudolino, A Misteriosa Chama da Rainha Loana e O Cemitério de Praga.
Entre as suas numerosas obras ensaísticas (académicas e outras), destacam-se: O Signo, Os Limites da Interpretação, Kant e o Ornitorrinco, A Passo de Caranguejo, Obra Aberta, Dizer Quase a Mesma Coisa - Sobre a Tradução e Como se Faz uma Tese em Ciências Humanas. Organizou ainda os livros ilustrados História da Beleza, História do Feio e História das Terras e dos Lugares Lendários.