segunda-feira, 18 de maio de 2020

Renault 5 Turbo: O mito nasceu há 40 anos



O mítico Renault 5 Turbo comemora 40 anos e continua a afirmar-se como um dos automóveis mais apaixonantes preservados pela nossa memória! Mas sabe quais são as suas origens? Imaginava que a ideia de o produzir surgiu dentro de um Renault 16? E que era fabricado como um “puzzle”, em três fábricas diferentes? E que a sua carreira de sucesso no automobilismo não se limitou aos ralis? E que, também em Portugal, o 5 Turbo ainda hoje é um dos automóveis recordados com mais saudade pelos fãs de ralis, graças ao “amarelinho” da Renault da década de 80? Todas estas estórias e muitas outras curiosidades nas linhas que se seguem…
O Renault 5 Turbo é e será, para sempre, um dos mais emblemáticos modelos construídos pela Renault. Admirado, desejado e, hoje, fortemente procurado e valorizado, é capaz de despertar fortes emoções só através do contacto visual, o que, por si só, dá bem conta do seu elevado carisma. 
Apresentando no Salão Automóvel de Paris, em Outubro de 1978, quase como um “ovni”, ainda como protótipo estático, o modelo granjeou de imediato suspiros e exclamações, que anteciparam o sucesso, dando-lhe o “boost” necessário para o tornar um automóvel de referência e um desportivo de antologia naquela altura, com a mesma força que hoje é já idolatrado clássico. 
A comemorar 40 anos, o modelo revolucionou o mundo dos desportivos, deixando também uma marca importante na história do desporto automóvel, influenciando uma geração que o viu nascer e foi alimentada pelo sonho de o conduzir e o privilégio de o ter, ainda que, efectivamente, só por uma grande minoria. 
Mas como quase sempre acontece com todos os grandes projectos que fazem história, também por detrás deste há uma envolvência especial. Voltemos atrás no tempo, revisitando a sua história… 
Tudo começou ao volante de um… Renault 16! 

O Renault 5 Turbo nasceu a partir de um… Renault 16! Bem, talvez a frase seja um pouco exagerada, mas a verdade é que a génese do pequeno-grande desportivo da Renault começou a desenhar-se dentro de um Renault 16, numa viagem nocturna entre Dieppe e Billancourt. 

Estávamos em 1976 e dentro do confortável R16 seguiam Jean Terramorsi, director de produto e responsável pelo desenvolvimento de séries limitadas dos modelos Renault, e o seu adjunto, Henri Lherm. Após mais um dia de trabalho e no regresso a casa, o tema da conversa era, claro, sobre a Renault, mas sobre um Renault muito especial, que completaria uma gama e dela se tornaria o expoente máximo, ao mesmo tempo que poderia brilhar também na competição: o Renault 5 equipado com turbocompressor, ou seja, a primeira viatura francesa equipada, de origem, com esta tecnologia produzida em série. 

Ninguém melhor que Terramorsis percebia os esforços desenvolvidos pela Renault para ser competitiva na Fórmula 1 e nas “24 Horas de Le Mans”, com a aposta na, então, inovadora tecnologia turbo. A ideia da criação de um Renault 5 Turbo começava, definitivamente, a ganhar forma, e não tardaria a ser apresentada aos responsáveis de topo da hierarquia da Régie, nomeadamente, a Bernard Hanon, então administrador-delegado da Renault, e a Gérard Larousse, director da Renault Sport. Da aprovação da ideia ao início da produção… secreta, foi um pequeno passo!

Projetco nº 822: lugar aos engenheiros

Entre 1976 e o Salão Automóvel de Paris de 1978, Michel Têtu e a sua equipa de engenheiros em Berex, Dieppe (França), foram chamados para tratar do desenvolvimento do chassis e da mecânica do futuro Renault 5 Turbo, ou, por outras palavras, para darem vida ao protótipo sob grande secretismo.  

Ao mesmo tempo, no Centro de Estilo da Renault de Rueil-Malmaison, na fábrica da Alpine, em Dieppe e da Heuliez, em Cerizay, todos os esforços se concentravam também, dia e noite, no desenvolvimento do projecto, ao nível do chassis e industrialização, sem esquecer o design, para o qual o estilista italiano Bertone, também foi chamado. O projecto com nome de código “822” estava em marcha… 
E foi um carro preto, guiado então pelo piloto Guy Fréquelin, que foi revelado à comunicação social, na pista de Lédenon, em Novembro de 1978, um mês após o lançamento do protótipo exposto no Salão Automóvel de Paris. A ele seguiram-se outras evoluções, denominadas “822-01”, “822-02” e “822-03”, esta última, a que acabaria por se estrear na competição, na Volta à Itália de 1979, com o mesmo Guy Fréquelin ao volante. Mas apesar da desistência com problemas de motor, o projecto provava estar pronto para enfrentar os desafios da competição, ao mesmo tempo, que, espectadores e jornalistas, ficavam rendidos às impressionantes formas da carroçaria do R5 Turbo. 
De resto, em Dieppe, a moral mantinha-se em alta, bem como a concentração de energia para optimizar o 5 Turbo, com o piloto Alain Serpaggi a cumprir milhares de quilómetros à procura da afinação ideal para a formidável máquina, na forma de diversos protótipos, para os quais, em termos de desempenho dinâmico, não se aceitava uma resposta menos que… perfeita! 
Mas para obter a preciosa homologação de competição, o Renault 5 Turbo também tinha que ser um automóvel de produção em série. E isso… bom, isso não foi fácil… 


Renault 5 Turbo: Construído como um “puzzle” em três diferentes fábricas
Sabia que o emblemático Renault 5 Turbo era um “puzzle” construído em três fábricas diferentes? E imaginava que, na sua primeira versão, os clientes só podiam escolher duas cores: carro azul ou vermelho? Voltamos a remexer no baú, para recuperar a história e algumas das curiosidades que ajudaram a tornar tão especial o icónico desportivo da Renault, agora com quatro décadas de história…

Início da produção em série: bem-vindo Renault 5 Turbo!

A ideia do projectar o Renault 5 Turbo nasceu em 1976, mas foi só, em janeiro de 1980, que foi apresentada a versão definitiva do irreverente modelo que havia de ficar na história da Renault, mas também da indústria automóvel, precisamente quatro meses antes de se iniciar oficialmente a sua produção. 

No dia da apresentação, perante a comunicação social, o R5 Turbo revelou-se um automóvel singular, impressionante nas formas, que o tornavam realmente único. Com o trem dianteiro derivado do Renault 5 Alpine, suportado por triângulos transversais e barras de torsão e com um novo “berço” traseiro, 23 cm mais largo que o original do 5 Alpine, a secção traseira rapidamente sobressaiu pela imponência, numa silhueta que, apesar da disparidade da largura entre a frente e traseira, se revelava, realmente, harmoniosa. 

A ela, acoplava-se um generoso motor central sobrealimentado, de 1397 cm3 (ou de 2 litros, depois de adoptado o coeficiente de correcção de 1.4 por ser sobrealimentado), alimentado por um turbo Garret T3 (com 0,9 bar), que fazia o motor debitar 160 cv às 6.000 rpm e 214 Nm de binário às 3250 rpm.  

Com toda uma panóplia de inovações derivadas da tecnologia “Turbo”, como a árvore de cames dissimétrica, o permutador ar/ar, a injecção Bosch K-Jetronic e a embraiagem bi-disco, a que se associaram um potente sistema de travagem de quatro discos ventilados – com a curiosidade de serem derivados do Citroën CX, com pinças do Renault Fuego – o Renault 5 Turbo prometia ser um concentrado de emoções. 

A sua singularidade estava também patente no restrito de opções de acabamentos com qu estava disponível para os poucos, mas afortunados clientes. Entre eles, apenas duas cores disponíveis: Azul Olimpo e Vermelho Granada. As carroçarias pintadas de azul tinham o habitáculo em vermelho e vice-versa, numa política que conferia ainda mais exclusividade ao modelo, mas que era também uma forma de amenizar os custos de produção. 



Processo de produção em três fases

Mas, ao contrário, do Renault 5 convencional, o 5 Turbo tinha um processo de produção bem mais complexo, desde logo, porque as unidades não saíam directamente de uma só linha de montagem, onde o “puzzle” ia sendo construído de A a Z. 

No modelo desportivo, a carroçaria do Renault era construída na fábrica de Flins, sendo depois transportada para a região de Cerisay, onde a Heuliez fazia a conversão e alargamento, colocando ainda o tejadilho e painéis das portas de alumínio, para além de instalar também a barra anti-aproximação dianteira que reforçava a rigidez do chassis, entre outros pormenores técnicos.   
Depois, com o recurso ao transporte em camiões, as unidades do R5 Turbo eram direccionadas para a fábrica da Alpine, em Dieppe, para que lhes fossem acoplados o spoiler dianteiro, a asa traseira e o capot em poliéster. Essa era também a fase em o modelo recebia o motor equipado com o inovador turbo Garret, a caixa de 5 velocidades, bem como todo o interior e a pintura final. Após a montagem, cada automóvel era levado para um teste de estrada na região da Normandia, a que se seguia outra e final qualificada inspecção. 
Um processo, afinal, moroso, mas que foi feito com extrema rapidez, dada a urgência da Renault em fabricar 400 unidades. O número mínimo para que o modelo pudesse candidatar-se à inspecção final que ditaria a homologação para a competição, por parte da FISA (Federação Internacional do Desporto Automóvel). 
Foi assim que todos os espaços da fábrica da Alpine, incluindo becos e redondezas, se encheram de Renault 5 Turbo’s, antes destes seguirem o seu caminho normal para os concessionários Renault e proporcionarem um brilho nos olhos muito especial aos seus novos proprietários. 
Da primeira versão, designada por “Renault 5 Turbo 1” ou apenas “Renault 5 Turbo”, foram construídos 1690 exemplares (802 em 1980, 536 em 1981 e 352 em 1982), tornando-se o modelo, rapidamente, uma coqueluche entre as opções disponíveis no mercado francês de veículos de carácter desportivo, concorrendo com outra “prata da casa”, o também exuberante Alpine A 310 V6.  
No último ano de produção, recebeu as primeiras mudanças, ainda que de pormenor, face às unidades produzidas inicialmente. A nível mecânico foi instalado um intercooler mais eficiente e, em termos de estéticos, as portas passaram a ser de metal em vez de alumínio, enquanto o 5 Turbo viu igualmente alargado o seu catálogo de cores. 
Produção em massa só com Renault 5 Turbo 2

No Salão Automóvel de Paris de 1982, a Renault lançou o Renault 5 Turbo 2, que diferia principalmente da versão anterior em termos de design do interior. Mas foi, no ano seguinte, que o modelo passaria por mudanças mais radicais, abandonando o sofisticado habitáculo com os estilosos bancos assinados por Bertone, para ver integrado os acabamentos interiores do “irmão” R5 Alpine Turbo, que lhe davam um ar de maior cumplicidade com a família Renault. 

Tecnicamente, o Renault 5 Turbo 2 herdava praticamente toda a mecânica do Renault 5 Turbo 1, permitindo-lhe manter o número de referência: R 8220. Contudo, na balança, acusava um peso superior de 30 kg, “compensada” por um preço de venda inferior (103.000 em vez de 115.000 francos – cerca de 40.000€, na altura). O seu sucesso continuou de vento em popa, e entre 1982 e 1986, foram produzidas 3.167 unidades do Renault 5 Turbo 2. 
No final de 1983, ficou claro que o próximo Renault 5 Turbo teria um lote especial de 200 unidades (“8221”), com a capacidade volumétrica do motor aumentada, por forma a que pudesse ser homologado em competição na categoria de Grupo B e participar no Campeonato do Mundo de Ralis. E, também aqui, o modelo deixou a sua marca!
“Vestido” à civil ou com “traje” de competição, fez correr muita tinta, gastou muitos rolos de fotografias e garantiu horas de filmes de vídeos, ao mesmo tempo, que despertou o desejo e exortou a paixão automóvel. Definitivamente, não foi por acaso que o Renault 5 Turbo se tornou imortal!