Por vezes os artigos de opinião são bastante fáceis de escrever, quer seja pela tendência de criticar negativamente, quer seja pelo facto de se querer destacar um ou outro aspecto do objecto alvo da nossa opinião.
No caso da peça “Casal da Treta”, em cena no Teatro Villaret, tudo se torna mais difícil, e porquê? Simples, porque esta peça é tão boa que é complicado ordenar as ideias para dizer tudo o que se quer.
Tentando colocar as ideias em ordem, “Casal da Treta” é aquilo a que no estrangeiro seria um spinoff ou uma sequela de um franchising que desde o início sempre viu a luz do sucesso. Esta encenação não foge à regra, visto ter as suas sessões sempre esgotadas.
Até há bem pouco tempo acompanhávamos as aventuras de Zezé e Tony, José Pedro Gomes e António Feio, em “Conversa da Treta”, que nos faziam um retrato cómico mas bem realista da sociedade portuguesa, quer fosse através do programa emitido na SIC, quer fosse no cinema ou através da peça de teatro.
Este mesmo retrato alcançou um sucesso estrondoso entre o público português, que fez do programa de televisão um líder de audiências e que levou os actores a salas emblemáticas como o Coliseu de Lisboa durante várias noites.
Com a partida de António Feio poder-se-ia pensar que este retrato da nossa sociedade terminaria, mas “Casal da Treta” revela-se uma extensão lógica e natural de “Conversa da Treta”, podendo até dizer-se que é o retrato que faltava.
José Pedro Gomes e Ana Bola interpretam Zézé e Detinha, um casal há mais de 40 anos, que nos leva durante quase duas horas a uma viagem pelo seu relacionamento, pelo seu bairro e incontornavelmente pela realidade actual do nosso país.
Neste “Casal da Treta” a fotografia de palco é o espelho perfeito de grande parte do povo português e do público que assiste à peça, público esse que pouco tempo tem para respirar entre gargalhadas.
Esta é, aliás, a genialidade da peça, fazer o público rir de si mesmo sem que este se aperceba da crítica, não necessariamente negativa, de que está a ser alvo.
Em “Casal da Treta” o cenário é minimalista: duas cadeiras, alguns efeitos de iluminação e pouco mais, mas seria preciso mais? A resposta é obviamente: Não.
Ana Bola e José Pedro Gomes enchem o palco com a sua experiência, genialidade e comicidade.
Por muito que me quisesse alongar a falar destes dois grandes actores, não sobra nem tempo nem espaço para dizer o que se quer.
Temos apenas de lhes agradecer por continuarem a brindar-nos com o seu infinito talento num meio tão ingrato como o meio cultural português e agradecer por vivermos na mesma Era que eles.
No final da peça fica aquele gosto amargo de quando acabamos algo que gostaríamos que continuasse.
Resta esperar que alguma mente sensata, pegue nesta peça e a leve para a televisão ou cinema, porque o público português merece e os profissionais envolvidos também.
Ditam as regras de um artigo de opinião, acabadas de inventar agora mas que parecem ser norma em muitos artigos publicados, que não se pode apenas dizer bem. Pois bem, então cá vai a parte um pouco menos boa.
Tudo se prende com a sala, o Teatro Villaret precisa urgentemente de uma remodelação, quer seja porque as cadeiras não são de todo confortáveis para o público, quer seja devido à sua acústica, muitas vezes o som não é perfeito, ou por estar demasiado baixo ou porque nem sempre se entende o que é dito pelos actores, sem ser culpa dos mesmos.
Sendo esta a terceira peça que assisto no Teatro Villaret no último ano, os problemas anteriores são transversais a todas elas.
Não se pense que o que foi dito anteriormente é impeditivo do regresso a uma das salas mais emblemáticas da capital portuguesa.
Não fosse a teimosia e amor dos actores, profissionais envolvidos e da produtora Força de Produção, de certeza teríamos a esta altura o Villaret encerrado ou pior, transformado em mais uma loja asiática.
Agora, se leu este artigo faça a todos um grande favor, compre os bilhetes aqui e vá apoiar o teatro português….. se ainda encontrar bilhetes disponíveis, uma vez que as sessões estão quase sempre esgotadas.