terça-feira, 8 de abril de 2025

Uma carta de amor à Rússia por uma jornalista em quinze anos de reportagens sobre os seus horrores



Logo depois de começar a guerra, a jornalista russa Elena Kostyuchenko foi à Ucrânia e regressou com uma reportagem para um jornal condenado ao fecho pela censura nessa primavera. Neste livro traça um retrato da Rússia desconhecida através de ensaios seus e também de reportagens escritas para a Novaya Gazeta ao longo de quinze anos. «Escrevi-o depois de ter perdido a minha casa e o meu país», escreve a autora. Considerado Livro do Ano pela The New Yorker e pela Time e vencedor do Pushkin House Book Award, Amo a Rússia chega agora a Portugal.

Em março de 2022, como correspondente do último órgão da imprensa livre russa, Novaya Gazeta, Elena Kostyuchenko atravessou a fronteira da Ucrânia para fazer a cobertura da guerra. Tinha como missão garantir que os russos testemunhavam os horrores que Putin cometia em nome deles. Elena preparou as suas peças sabendo que, ao regressar a casa, seria provavelmente acusada e condenada a uma pena de prisão que podia ir até quinze anos. Porém, impulsionada pela convicção de que a maior forma de amor e patriotismo é a crítica, continua a escrever.

Ser jornalista é contar a verdade. Amo a Rússia é a tentativa de Elena Kostyuchenko documentar o seu país através das experiências daqueles que são sistemática e brutalmente eliminados: raparigas das aldeias recrutadas para trabalho sexual, pessoas queer de províncias distantes, pacientes e médicos de uma maternidade ucraniana e repórteres como ela própria.

Ao longo de 13 capítulos a autora leva os leitores por memórias da sua vida e do seu país e, na «Conclusão», percorre os corredores do jornal e partilha histórias só conhecidas por quem lá trabalhou. «Fizemos bem o nosso trabalho, tentámos com muita força. Lá fora aconteciam coisas aterradoras, nojentas, de partir o coração. Ali dentro, estava quentinho», escreve a autora. Enquanto os outros meios de comunicação foram sendo silenciados, com a censura a proibir artigos e a fechar publicações, a Novaya Gazeta tentou manter-se firme. «Continuamos o nosso trabalho 32 dias, a partir do primeiro dia da guerra», depois chegaram os avisos da censura e a revogação da licença de imprensa e a Novaya Gazeta deixou de existir. «Depois de tudo o que sempre temi que acontecesse ter acontecido de facto, estou vazia, não tenho nada a que me agarrar, posso pensar.»

Bela Shayevich e Ilona Yazhbin Chavasse traduziram o livro de russo para inglês e deram-lhe a dimensão internacional que merece. Shayevich é soviético-americana, escritora e tradutora premiada pela tradução para inglês do livro O Fim do Homem Soviético, da laureada com o Nobel Svetlana Alexievich. Chavasse nasceu na Bielorrússia soviética, é tradutora e vive em Londres.

Amo a Rússia combina reportagens dos últimos quinze anos com ensaios pessoais, criando uma narrativa caleidoscópica que Kostyuchenko sabe que poderá ser a última que publica sobre a sua pátria durante muito tempo — ou quiçá a derradeira. Expõe os mecanismos internos de toda uma nação que mergulha no fascismo e, inevitavelmente, na guerra. Ela escreve porque a ameaça da Rússia de Putin se estende para além de si própria, para além da Crimeia e da Ucrânia. Só não a percebemos se não quisermos.

Sobre a Autora

Elena Kostyuchenko nasceu em Yaroslavl, na Rússia em 1987. Iniciou-se no jornalismo aos 14 anos, e passou dezassete a trabalhar para a Novaya Gazeta, o último grande jornal independente da Rússia que seria encerrado na primavera de 2022 depois da reportagem que Elena fez na Ucrânia. É autora de dois livros publicados em russo, «Indesejado em Liberdade Condicional» e «Temos de Viver Aqui», e foi distinguida com o European Press Prize, o Gerd Bucerius Award e o Paul Klebnikov Prize.