Trinta anos volvidos sobre o genocídio tútsi, chega a Portugal Inyenzi ou As Baratas, o poderoso testemunho de Scholastique Mukasonga, escrito a partir de França, depois de décadas de exílio, pavor e humilhação. «Na noite de 6 de abril de 1994, Deus não estava no Ruanda», desabafa a autora cuja família foi dizimada.
«Fecho os olhos, será mais uma noite sem dormir. Tenho tantos mortos a velar.» Nascida no sudoeste do Ruanda, Scholastique Mukasonga viveu uma infância já deveras perturbada pela instabilidade social do seu país, onde a violência de Hútus sobre Tútsis era constante. Mas nada a prepararia para o horror que décadas depois viria a assolar o seu povo, a sua família. Desterro, humilhação constante, medo diário, terror organizado. Em suma, a agonizante espera «daquilo que ia suceder e ao qual nós não sabíamos dar o nome: genocídio.» Passaram exatamente trinta anos. «E eu sou a única a guardar a sua memória. É por isso que escrevo estas linhas», confessa nas páginas iniciais de Inyenzi ou As Baratas, o seu livro de estreia, finalmente publicado em Portugal, na coleção Contemporânea.
Ao todo, foram um milhão de vítimas que perderam a vida e o nome. Os restos mortais de todos eles nunca seriam encontrados. Onde estão eles? «De que serve contar e recontar os mortos», questiona esta obra considerada pelo The New York Times um dos 50 melhores livros de memórias dos últimos 50 anos.
O livro estará disponível nas livrarias a 19 de setembro.
Autora multipremiada, já distinguida com o Prémio Simone de Beauvior para a Liberdade das Mulheres pelo conjunto da sua obra, Scholastique Mukasonga será convidada do próximo FOLIO – Festival Literário Internacional de Óbidos, subordinado ao tema «Inquietação», numa sessão agendada para 19 de outubro, às 18:00.
Sobre a Autora
Scholastique Mukasonga nasceu em 1956 na província de Guicongoro, no sudoeste do Ruanda. Tinha três anos quando aconteceram os primeiros massacres de tútsis e em 1960 a sua família foi deportada e fixada, juntamente com muitas outras, em Nyamata. Apesar de existir uma quota de apenas dez por cento para tútsis no ensino secundário, Mukasonga frequentou o liceu de Kigali e a escola de assistentes sociais em Butare. Depois de em 1973 os tútsis terem sido banidos das escolas, fugiu para o Burundi, onde completou os estudos e trabalhou na UNICEF. Em 1992 estabeleceu-se em França e em 2006 publicou o seu primeiro livro, Inyenzi ou as Baratas.