sábado, 11 de janeiro de 2020

Crónica "Sobre isto e aquilo" - Deolinda Laginhas



O que é isto do Direito da Habitação Vitalícia?

Não é novidade para ninguém, que o panorama da habitação em Portugal, nomeadamente nos grandes centros urbanos, mudou de forma drástica nos últimos anos.

De facto, durante quase três décadas, os portugueses privilegiaram a habitação própria adquirida maioritariamente através de crédito bancário, numa altura em que a prestação mensal paga ao banco era consideravelmente menor do que as rendas praticadas no mercado de arrendamento. Disto resulta que, hoje, 73% das famílias em Portugal, são proprietários do imóvel que habitam.

Este e outros factores levaram a uma degradação do parque habitacional de arrendamento e consequentemente à diminuição drástica da oferta.

A entrada de novos players no mercado, nomeadamente os residentes estrangeiros e os fundos de investimento vieram dar um impulso ao sector imobiliário, muitas vezes com características especulativa (tendo-se verificado diversas situações de assédio) e criando ainda maiores entraves ao acesso à habitação das camadas mais desprotegidas do ponto de vista financeiro – idosos e jovens.

O direito à habitação está constitucionalmente consagrado e deve ter em consideração a segurança e a estabilidade de que as famílias precisam, sendo da responsabilidade do governo criar as condições para a sua realização efectiva.

Atentos a esta realidade, tem havido um esforço legislativo (nem sempre conseguido) para uma nova geração de políticas de habitação (NGPH), capaz de contribuir para “ resolver problemas herdados e para dar resposta à nova conjuntura do sector habitacional”, de onde se destaca a lei n.º 1/2020 de 9 de Janeiro que consagra o direito real de habitação duradoura.

Esta lei veio criar um novo direito. Não se trata de um arrendamento, no entanto, quem ocupa o imóvel também não é o seu proprietário.

Na verdade, o morador passa a ter o direito de permanecer de forma vitalícia (o direito cessa com a morte) no imóvel que é propriedade de outrem. Em que condições?
  1. O imóvel é entregue livre de ónus ou encargos e o contrato é celebrado através de escritura pública ou DPA;
  2. O direito de habitação é inscrito no registo predial;
  3. O morador paga um valor inicial que varia de entre 10 % a 20% do valor mediano das vendas praticadas na zona, a título de caução;
  4. As partes acordando uma prestação mensal a pagar até final do contrato;
  5. Caso o morador cesse o contrato nos primeiros 10 anos, a caução é devolvida;
  6. A partir do 10 ano do contrato, o proprietário passa a descontar 5% da caução a cada ano
Mantém-se na obrigação do proprietário os custos relativos às partes comuns do prédio; dos seguros obrigatórios; custos de obras extraordinárias na habitação.

Por sua vez, o morador tem a obrigação do pagamento do IMI; promover pela conservação do imóvel e realizar as obras de conservação ordinárias.

Dado os valores envolvidos e a ambiguidade do regime, existem algumas dúvidas (inclusivamente manifestadas pelo Presidente da República) quanto ao sucesso desta medida.

O tempo o dirá!

Apresentação Deolinda Laginhas

O meu nome é Deolinda Laginhas, 47 anos.
Desde sempre apaixonada pelas relações internacionais, área em que inicialmente me formei, descobri posteriormente o direito, tendo-me licenciado em solicitadoria, profissão que tenho vindo a exercer.
Sendo as minhas várias áreas de interesse, indissociáveis na minha forma de ver o mundo, procuro nesta crónica falar “sobre isto e aquilo”, procurando temas que pela sua actualidade e importância legal ou social mereçam aqui ser abordados.