A Dom Quixote edita hoje, 21 de outubro, "Uma Aldeia no Terceiro Reich", das historiadoras Julia Boyd e Angelika Patel que explicam como vidas vulgares foram transformadas pela ascensão do fascismo e tentam compreender melhor os nazis olhando para o quotidiano de uma aldeia situada no sopé dos Alpes onde a célebre realizadora Leni Riefenstahl esquiava.
"Neste livro as histórias íntimas e pormenorizadas das vidas dos residentes são colocadas em contraste com a vasta tela do III Reich", escrevem as historiadoras na introdução desta narrativa que permite aos leitores viver e respirar a história de Oberstdorf, a aldeia mais a sul da Alemanha e dos seus dez mil habitantes – com todos os seus problemas, sonhos, esperanças e fraquezas, compromissos e contradições.
Alemães comuns, uns chamados para combater na União Soviética, outros perseguidos pelas medidas anti-judaicas, todos sujeitos à privação e ao racionamento. Mas que, consoante a sua ética e personalidade, se comportaram de forma muito diferenciada. O caso mais emblemático é o do presidente do município, Ludwig Fink(1888–1974), que antes de ser nomeado em 1934, era chefe dos limpa-chaminés do distrito. Aparentemente um devoto nazi, Fink ficou conhecido, no entanto, por ter protegido os judeus que viviam sob a sua jurisdição, ajudar as freiras a sobreviver e apoiar os aldeões levados a tribunal. Localmente era muito apreciado, mesmo por aqueles que não partilhavam as suas ideias políticas.
Ou o médico da terra, Dr. Fritz Kalhammer (1902–1968) que, subiu rapidamente na hierarquia do partido. Apesar da sua importância, era um homem moderado, que protegia os judeus e procurava cuidar bem das pessoas sob a sua jurisdição. "Fink e Kalhammer eram ambos nazis fervorosos em altos cargos de poder e influência, mas parece que também eram seres humanos decentes – uma combinação rara."
Mas descobrimos também as ligações da famosa realizadora alemã Leni Riefenstahl (e a brilhante esquiadora que era) a este local no alto dos Alpes Bávaros, um lugar onde, durante centenas de anos, os habitantes viveram vidas simples enquanto a História era feita em outros lugares. Mas estas páginas passam também judeus que sobreviveram, como Hertha Stolzenberg (1889–1960). Meio-judia, desistiu de uma carreira de sucesso como cantora de ópera em 1932 para ir viver com a mãe, que era totalmente judia, em Oberstdorf, onde esperava escapar ao crescente antissemitismo. Como membro da igreja protestante da aldeia, ensaiou o seu coro, conduzindo-o a um elevado nível de excelência. Embora provavelmente se soubesse que ela e a mãe eram judias, as duas mulheres sobreviveram ilesas à guerra.
E a madre superiora Maria Biunda (1891–1972), responsável pelo pequeno grupo de freiras franciscanas que residiam em Oberstdorf desde 1907. As irmãs geriam uma creche, ensinavam as raparigas da aldeia até aos 14 anos e tiveram um ateliê de costura até novas leis nazis restringirem as suas atividades, em meados da década de 1930. Com a ajuda do presidente da câmara e de outros residentes, as freiras sobreviveram à guerra e continuam presentes na aldeia.
Sobre as Autoras
Viúva de um ex-diplomata, Julia Boyd morou na Alemanha de 1977 a 1981. Atualmente, vive em Londres.
Angelika Patel nasceu numa família antiga de Oberstdorf. Estudou História e Literatura Alemã antes de fazer um MBA no INSEAD, em Fontainebleau.Vive entre Londres e Oberstdorf.