quinta-feira, 22 de junho de 2023

A viajar com Borges e María Kodama



«O que é um atlas para nós, Borges? Um pretexto para entretecer na urdidura do tempo os nossos sonhos feitos da alma do mundo.» A voz de María Kodama (falecida em março deste ano, companheira de Jorge Luis Borges, com quem começou a viajar em 1975) ecoa no epílogo de Atlas, o derradeiro livro do grande escritor argentino que a Quetzal agora reedita, numa altura em que Borges e María estão definitivamente juntos, num tempo onde a Poesia, o Amor e a Beleza são incandescentes.

Cada título engloba uma unidade, feita de imagens e de palavras. Os lugares, as cidades e os países que percorreram juntos foram vistos e vividos por Borges através dos sons, das línguas que neles se falavam, da textura do ar, das qualidades da luz. Kodama fotografava e descrevia; Borges recitava e, da memória, recuperava nomes, poemas, fragmentos e testemunhos da grande literatura. Escreveu depois pequenos textos: sobre a História, os mitos e a poesia que habitavam esses lugares, aliando às impressões de viagem a riqueza inesgotável da sua biblioteca. Por isso, nestas páginas está grande parte dos seus sonhos, dos seus escritores preferidos, dos temas que sempre povoaram os seus livros e as suas alegrias.

A edição da Quetzal que chega hoje às livrarias, com tradução de Fernando Pinto do Amaral, dá continuidade à série de novas capas retiradas do tríptico As Tentações de Santo Antão, do pintor Hieronymus Bosch, exposto no Museu Nacional de Arte Antiga, em Lisboa.

Sobre o Autor

Jorge Luis Borges nasceu em Buenos Aires, em 1899. Cresceu no bairro de Palermo, «num jardim, por detrás de uma grade com lanças, e numa biblioteca de ilimitados livros ingleses». Em 1914 viajou com a família pela Europa, acabando por se instalar em Bruxelas, e posteriormente em Maiorca, Sevilha e Madrid. Regressado a Buenos Aires, em 1921, Borges começou a participar ativamente na vida cultural argentina. Em 1923, publicou o seu primeiro livro – Fervor de Buenos Aires –, mas o reconhecimento internacional só chegou em 1961, com o Prémio Formentor, seguido por inúmeros outros. A par da poesia, Borges escreveu ficção (é sem dúvida um dos nomes maiores do conto ou da narrativa breve), crítica e ensaio, géneros que praticou com grande originalidade e lucidez. A sua obra é como o labirinto de uma enorme biblioteca, uma construção fantástica e metafísica que cruza todos os saberes e os grandes temas universais: o tempo, «eu e o outro», Deus, o infinito, o sonho, as literaturas perdidas, a eternidade – e os autores que deixam a sua marca. Foi professor de literatura e dirigiu a Biblioteca Nacional de Buenos Aires entre 1955 e 1973. Morreu em Genebra, em junho de 1986.