Os olhares de Harriet e David cruzaram-se durante uma festa de empresa, à qual nenhum dos dois tivera muita vontade de ir. De copo na mão, ambos observavam os restantes convidados, que dançavam freneticamente. Não se identificavam com o que viam, e foi isso que os juntou.
Ao contrário dos colegas, Harriet e David não se reviam nos valores contracorrente da Londres dos anos 60. Conservadores, ambicionavam uma vida familiar tradicional, com quatro ou cinco filhos, e uma casa vitoriana com um vasto jardim e uma sala de grandes dimensões, onde pudessem construir um núcleo familiar coeso, que os protegesse das pressões da sociedade que os rodeava.
O sonho cumpre-se, e Harriet e David vivem num mundo idílico até ao nascimento de Ben, o quinto filho, que vem abalar o equilíbrio familiar que o casal tanto se esforçou por criar.
Ben é uma criança diferente. A gravidez e o parto foram mais difíceis do que os dos restantes filhos, e desde o início que Ben revela características que o distinguem dos irmãos. Robusto, agressivo e com uma fome que parece impossível de saciar, o quinto filho de Harriet e David tem limitações quanto à interação social e parece ser incapaz de qualquer ligação emocional.
Confrontada com esta situação, Harriet vê-se numa posição difícil. Tem de cuidar de Ben, mas tem de proteger a família desta criança estranha e difícil, com os olhos brilhantes de prazer intenso. Assustada, Harriet assiste ao crescimento do seu quinto filho, que vai destruindo pouco a pouco a tranquilidade do lar e da família em que nasceu.
Romance curto, mas poderoso, escrito sem capítulos ou pausas, O Quinto Filho é uma das obras mais inquietantes de Doris Lessing, Prémio Nobel da Literatura em 2007, explorando, de forma crua e incisiva, as questões ligadas à maternidade, e revelando que esta é, de facto, um conjunto de escolhas muitas vezes impossíveis de conciliar.
O livro, com tradução de Cristina Rodriguez, chega amanhã às livrarias, pela Bertrand Editora.
Sobre a Autora
Doris Lessing nasceu em 1919 em Kermanshah, no atual Irão, e morreu em 2013, em Londres. Foi uma das mais importantes escritoras do século XX, tendo sido galardoada com o Prémio Nobel da Literatura em 2007. Outras distinções literárias que recebeu foram o Prémio Somerset Maugham, o Prémio Médicis, o Prémio Princesa das Astúrias de Letras e o Prémio David Cohen de Literatura, além de três nomeações para o Booker Prize. Em 1991, recebeu o título de Distinguished Fellow in Literature, da School of English and American Studies, atribuído pela Universidade de East Anglia, e, em 1995, o título de Doutora Honoris Causa, atribuído pela Universidade de Harvard. Em 2001 recebeu o título de Companion of Honour da Royal Society for Literature do Reino Unido. Escreveu cerca de sete dezenas de livros ao longo de uma carreira que cobriu quase oitenta anos. Levando constantemente o romance a ultrapassar os limites das convenções, Lessing não teve medo de explorar temas considerados tabu em obras provocadoras e inventivas. E sempre influentes.