O Auditório dos Oceanos do Casino Lisboa inicia, a partir do próximo dia 29 de Novembro, às 21h30, um ciclo de representações de “O Deus da Carnificina”, uma comédia de costumes…sem os bons costumes. A peça da dramaturga Yasmina Reza distingue-se pela encenação de Diogo Infante.
Dois casais, adultos e aparentemente civilizados, encontram-se para resolver um incidente protagonizado pelos seus filhos menores. O que é verdadeiramente sedutor neste confronto é a progressão paradoxal do encontro dos casais. Há uma certa sofisticação na forma como o encontro decorre na tentativa de apurar responsabilidades na luta física que ocorreu entre os respetivos filhos, dois jovens de 11 anos.
O que acontece na realidade é a queda progressiva das máscaras a que nos obrigamos no acto social e um estalar do verniz, que deixa a nu a natureza violenta dos relacionamentos humanos. As conversas entre os quatro são constantemente interrompidas pelo telemóvel de Alberto, advogado de uma multinacional farmacêutica, acusada de vender medicamentos para cardíacos que produz efeitos colaterais. A sua mulher Bernardete, é uma mulher com ambições sociais e com uma curta tolerância ao álcool. Verónica, é uma dona de casa, vagamente interessada em arte africana e o seu marido Miguel é um vendedor de electrodomésticos.
Nada é claro ou linear. Ninguém é normal. As primeiras impressões vão-se contradizendo, negando-se, alterando-se em contacto com as outras. Pouco a pouco vamos sendo levados para o núcleo da nossa natureza primordial, selvagem e violenta. Todos são capazes de pensamentos politicamente correctos, mas também se mostram capazes de usar golpes baixos e letais, quando se trata de defender o interesse próprio ou dos filhos.
O tema da peça é, necessariamente, a “Hipocrisia”, ou se preferirmos, a dupla moral e de como perspectivas éticas se mostram flexíveis para defenderem certos interesses. O que é curioso é que toda esta dimensão ética e política é colocada neste texto em termos profundamente cómicos.
“O Deus da Carnificina” é por isso uma comédia, mesmo que o riso tenha como fronteira a dor que sempre sentimos, quando constatamos a nossa fragilidade humana.