“Há espectáculos de que continuamos a falar muito tempo depois, houve uma chispa. Não se apagou.” Quem o afirma é o próprio Sérgio Godinho e, de facto, a série de concertos que o músico deu entre 5 e 8 de Julho de 2018 na Sala Luís Miguel Cintra do São Luiz Teatro Municipal, em Lisboa, perdura ainda hoje na memória de quem teve oportunidade de os assistir. O registo desses espectáculos chega agora em disco. “Ao Vivo no São Luiz” chega agora às lojas.
Entretanto, já se encontra disponível no YouTube o vídeo ao vivo da célebre canção “Com Um Brilhozinho nos Olhos”. O tema editado, pela primeira vez, em 1981 no álbum “Pano-Cru” depressa se tornou um clássico moderno e não há como dissociá-lo do “escritor de canções”. E é ele que diz: “Com um brilhozinho nos olhos dispensa apresentações como se costuma dizer. É uma canção que tem, também como as outras, várias vidas e essas vidas dão-me sempre um elemento de prazer acrescentado. É uma canção muito lúdica, baseada em ditos quotidianos e que resultou muito bem com o público, porque a conhece e a canta no refrão comigo, chegando a substituir-me.”
É esta a primeira amostra deste disco, no qual se encontram as músicas de sempre, as que cantamos de cor e nunca nos cansamos de as ouvir – como também o são “A Noite Passada” ou “O Primeiro Dia” – aqui revistas e pela primeira vez gravadas com orquestra.
Mas “Ao Vivo no São Luiz” tem ainda o charme de nele se encontrarem temas que há muito Sérgio Godinho não cantava ao vivo. “O Velho Samurai”, por exemplo, é aqui reanimado e volta a ganhar vida. “O Velho Samurai foi umas das canções que nós repegamos e que desde há muito tempo não era praticada. É uma canção que me apraz pelo seguinte, é um retrato de um homem a quem a vida não correu muito bem mas que ao mesmo tempo tem uma dignidade de não dar parte de fraco, tem um brio que é muito dele. E eu identifico-me com essa atitude, embora a minha vida tenha corrido melhor felizmente até aqui e já vai longe”, explica o cantautor.
Sérgio Godinho canta aqui parceiros que sempre lhe foram caros e vão continuara a ser. Zeca Afonso é aqui chamado com “Endechas a Bárbara Escrava” que, nas palavras de Sérgio Godinho é “uma canção que à partida é uma obra prima. Eu estou à vontade para o dizer porque não fui eu que a compus. Mas é de uma dupla chamamos-lhe assim insuperável, Luís de Camões, um poema de Luís de Camões, sobre os seus amores por uma escrava negra, bárbara escrava. E com música e interpretação primeira do nosso Zeca Afonso. Eu já há muito tempo, inclusivamente já a gravei, que gosto de cantar esta canção e aqui também com a anuência e a colaboração do Filipe e da Orquestra foi um prazer repegar nela.”
Assim como José Mário Branco, com quem compôs “Mariana Pais, 21 Anos”, um tema integrado no seu mais recente álbum de originais “Nação Valente”. “Mariana Pais é a minha última parceria, não sabia então, com o José Mário Branco. Nós os dois criámos canções juntos desde os nossos primeiros discos, ainda em Paris. E depois tivemos muitas aventuras juntos, como os Três Cantos etc. Eu pedi ao José Mário uma música para fazer uma letra. E saiu uma história de uma rapariguinha de vinte e um anos com sede de ter mundo. Essa sede que eu também tinha e de certo modo tenho ainda e que tive durante toda a vida. É uma canção tocante e que me agradou cantar nesta versão orquestral também.”
Nestes concertos que deu no São Luiz Teatro Municipal, Sérgio Godinho esteve, como sempre, acompanhado d’Os Assessores, constituídos por Miguel Fevereiro (guitarras eléctricas e acústicas, percussão, coros), Nuno Espírito Santo (baixo, percussão), João Cardoso (teclados, samplers, coros), Sérgio Nascimento (bateria, percussão) e a direcção musical de Nuno Rafael (guitarras eléctricas e acústicas, cavaquinho, lap steel guitar, percussão, coros).
E, pela primeira vez, Sérgio Godinho atuou ao lado da Orquestra Metropolitana de Lisboa e do maestro Cesário Costa. O piano e os arranjos para orquestra ficaram a cargo de Filipe Raposo. “Nunca, até agora, fiz um concerto com uma orquestra sinfónica, e isso, mais do que uma lacuna no currículo, era uma lacuna no prazer”, disse.
O São Luiz foi também a sala ideal para esta estreia de Sérgio Godinho ao lado de uma orquestra. “O São Luiz é de há muito a minha casa. Nela actuei tantas vezes, em tantos formatos, que não há dedos que as contem. É um currículo em si, que reconheço com orgulho. Até porque esta foi uma sala que conheci, no início de Maio de 1974, num dos primeiros cantos livres, todos no palco, e tocas tu, toco eu. Foi o meu primeiro grande momento de comunicação em Portugal. E logo nesta sala, vinda de outras memórias. Foi importante.”
“Ao Vivo no São Luiz” é o primeiro disco de Sérgio Godinho gravado com orquestra, iniciando assim as celebrações de 50 anos de uma das carreiras mais marcantes da história da música portuguesa. O disco conta, pela primeira vez, com canções do álbum “Nação Valente” (2018) editadas ao vivo, bem como outros temas emblemáticos dos 50 anos de percurso de Sérgio Godinho.